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A análise do ROI da Lei do Bem começa pela identificação das despesas de PD&I elegíveis, avança pela simulação da economia de IRPJ e CSLL e se completa quando a empresa compara esse ganho com os custos de implantação e manutenção do programa, incluindo horas internas, sistemas e consultorias. Com dados históricos, cenários conservadores e governança integrada entre P&D, fiscal, contábil e jurídico, torna-se possível prever a economia tributária anual com maior segurança, calcular payback e demonstrar ao comitê executivo que a Lei do Bem pode gerar retorno relevante tanto sobre o investimento em P&D quanto sobre o próprio projeto de utilização do incentivo fiscal.
ROI real da Lei do Bem

ROI real da Lei do Bem: como calcular o impacto financeiro e prever economia tributária com segurança 

Ao longo dos últimos anos, a Lei do Bem consolidou-se como o principal instrumento de incentivo fiscal à inovação no Brasil, permitindo que empresas em regime de Lucro Real reduzam a carga de IRPJ e CSLL a partir de investimentos em pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I). Em 2024, mais de 4,2 mil empresas utilizaram o benefício, com renúncia fiscal estimada em cerca de R$ 12 bilhões e investimentos superiores a R$ 50 bilhões em projetos inovadores.  
Para transformar esse cenário em decisão estratégica, a discussão precisa avançar da visão apenas jurídica para uma visão financeira estruturada de retorno sobre investimento (ROI). 

1. O que significa falar em ROI da Lei do Bem

Quando se fala em ROI da Lei do Bem, é possível olhar por pelo menos dois ângulos complementares: 

  1. ROI sobre o investimento em P&D 
  1. Quanto a empresa recupera em economia tributária em relação ao valor que investe em projetos de inovação. 
  1. ROI sobre o projeto de implantação da Lei do Bem 
  1. Quanto a empresa captura em benefício fiscal em comparação aos custos de estruturação: horas internas, consultorias, ferramentas, processos e governança. 

Essa visão financeira permite levar o tema para comitês executivos e conselhos com uma linguagem clara de resultado: redução efetiva de imposto pago, impacto em caixa e payback do esforço de implantação. 

2. Entendendo o mecanismo financeiro da Lei do Bem

A Lei do Bem (Lei nº 11.196/2005) concede incentivos fiscais às empresas em regime de Lucro Real que investem em PD&I no país. Os principais efeitos financeiros são:  

  • Exclusão adicional da base de IRPJ/CSLL das despesas elegíveis de PD&I, em percentuais que podem chegar a 60% a 100% adicionais, dependendo do perfil dos projetos e de alguns fatores de incremento previstos em lei. 
  • Renúncia fiscal potencial de até cerca de 34% sobre a base adicional, considerando IRPJ (25%) e CSLL (9%), para empresas com a alíquota cheia. 
  • Outros benefícios complementares, como: 
  • Redução de 50% do IPI na compra de determinados equipamentos para P&D; 
  • Depreciação e amortização aceleradas; 
  • Redução de IRRF em remessas ao exterior ligadas a marcas, patentes e cultivares, conforme condições legais. 

Em termos práticos, o benefício central vem da possibilidade de reduzir o IRPJ e a CSLL a pagar através de uma base de cálculo menor, derivada da exclusão adicional dos gastos com PD&I. 

 

3. Passo a passo para calcular o ROI real da Lei do Bem

3.1. Mapear as despesas potencialmente elegíveis 

O primeiro movimento é identificar, dentro da contabilidade e dos centros de custo, quais despesas estão relacionadas a atividades de PD&I: 

  • Folha de pagamento de equipes de P&D (salários, encargos, benefícios proporcionais). 
  • Serviços de terceiros especializados (desenvolvimento, testes, protótipos, ensaios). 
  • Materiais de consumo utilizados em experimentos, protótipos e provas de conceito. 
  • Software, licenças e infraestrutura utilizados diretamente em projetos de desenvolvimento tecnológico. 
  • Equipamentos adquiridos e usados em laboratórios ou em desenvolvimento de novos produtos e processos. 

Esse mapeamento precisa ser minimamente sistemático para evitar tanto a subaproveitamento do benefício quanto a inclusão indevida de despesas que não atendem aos critérios técnicos de PD&I. 

3.2. Segregar atividades de PD&I de atividades rotineiras 

Em seguida, é importante diferenciar: 

  • Projetos com caráter de inovação tecnológica, nos termos do MCTI (novidade, ganho de desempenho, incerteza técnica, resultados mensuráveis).  
  • Atividades meramente operacionais, de manutenção ou rotineiras, que não são consideradas PD&I para fins da Lei do Bem. 

Essa análise técnico-metodológica é o que sustenta a elegibilidade perante o MCTI e reduz riscos em eventual fiscalização. 

3.3. Definir a base de cálculo do incentivo 

Com os projetos elegíveis definidos, a empresa calcula: 

  1. Total de despesas em PD&I no ano. 
  1. Parcela elegível (desconsiderando itens não enquadráveis). 
  1. Percentual de exclusão adicional previsto em lei (por exemplo, 60%, 80% ou mais, conforme os critérios aplicáveis). 

A partir disso, obtém-se a base adicional que será excluída na apuração de IRPJ/CSLL. 

3.4. Simular a economia tributária 

Com a base adicional definida, a simulação é direta: 

Economia tributária estimada = Base adicional × Alíquota efetiva de IRPJ + CSLL 

Em empresas com alíquota cheia, essa alíquota tende a ficar próxima de 34% 

É importante também considerar: 

  • Regime de apuração do lucro (trimestral ou anual). 
  • Possíveis compensações de prejuízos fiscais ou bases negativas. 
  • Impactos em estimativas mensais ao longo do ano. 

3.5. Levantar custos de implementação e manutenção 

Para ter o ROI real, não basta conhecer a economia tributária bruta. É preciso estimar: 

  • Horas de times internos (P&D, fiscal, contabilidade, jurídico, controladoria). 
  • Custos de consultorias especializadas em Lei do Bem. 
  • Investimentos em sistemas de gestão de projetos, rastreabilidade e documentação técnica. 
  • Eventuais custos de auditorias, pareceres técnicos e suporte em interações com o MCTI. 

Isso forma o “denominador” do ROI quando se avalia o retorno sobre o projeto de implantação da Lei do Bem. 

3.6. Projetar fluxo de caixa e payback 

Por fim, é possível: 

  • Estimar quanto de imposto deixará de ser pago no ano de referência. 
  • Enxergar o impacto no fluxo de caixa do período. 
  • Calcular o payback do projeto (em quantos meses a economia tributária compensa o investimento em estrutura e governança). 

Essa visão permite comparar o uso da Lei do Bem com outras iniciativas de eficiência fiscal e de alocação de capital. 

4. Como prever economia tributária com segurança

Previsibilidade é o que permite tratar a Lei do Bem como um “programa de eficiência fiscal” recorrente, e não como um benefício ocasional. 

Algumas boas práticas para projetar a economia de forma consistente: 

  1. Uso de dados históricos 
  1. Analisar o histórico de investimentos em P&D por área, produto e unidade de negócio. 
  1. Identificar um “piso” anual de PD&I que tende a se repetir. 
  1. Construção de cenários 
  1. Cenário conservador (apenas projetos com altíssima evidência de inovação). 
  1. Cenário base (padrão de aprovação esperado). 
  1. Cenário agressivo (maior percentual de projetos elegíveis), usado com cautela. 
  1. Governança integrada 
  1. Alinhamento entre P&D, fiscal, contábil e jurídico para definir critérios e fronteiras de elegibilidade. 
  1. Comitês periódicos para revisar pipeline de projetos e estimar a base de PD&I antes do fechamento do ano. 
  1. Documentação robusta 
  1. Registro sistemático de objetivos técnicos, hipóteses, incertezas, resultados, protótipos e testes. 
  1. Histórico de versões, evidências de experimentação e métricas de desempenho, em linha com as exigências do MCTI.  
  1. Monitoramento da legislação e dados públicos 
  1. Acompanhamento de atualizações do MCTI e da Receita Federal.  
  1. Uso de dados públicos de renúncias fiscais e benchmarks para avaliar se o nível de benefício da empresa está alinhado com o que se observa no mercado. 

5. Exemplo numérico simplificado de ROI da Lei do Bem

Considere uma empresa de Lucro Real com as seguintes características no ano: 

  • Investimento total em P&D: R$ 10.000.000 
  • Percentual das despesas considerado elegível: 70% 
  • Base de P,D&I elegível: R$ 7.000.000 
  • Percentual de exclusão adicional aplicável: 70% 
  • Base adicional para Lei do Bem: R$ 4.900.000 
  • Alíquota efetiva de IRPJ + CSLL: 34% 
  1. Economia tributária estimada 

Economia tributária = R$ 4.900.000 × 34% ≈ R$ 1.666.000 

  1. ROI sobre o projeto de implantação da Lei do Bem 

Suponha que a empresa tenha gastado R$ 250.000 em estrutura (horas internas, sistema, consultoria, auditoria). 

ROI (projeto Lei do Bem) = R$ 1.666.000 ÷ R$ 250.000 ≈ 6,66 
Ou seja, para cada R$ 1 investido na implantação, a empresa obtém cerca de R$ 6,66 em economia de imposto. 

  1. ROI sobre o investimento em P&D 

ROI fiscal sobre P&D = R$ 1.666.000 ÷ R$ 10.000.000 ≈ 16,7% 

Isso significa que, além do retorno estratégico e de mercado dos projetos de inovação em si, a empresa ainda captura aproximadamente 16,7% do valor investido em P&D de volta em forma de economia tributária. 

6. Checklist rápido para levar ao comitê executivo

Para transformar o tema em decisão alinhada com a alta gestão, um resumo objetivo pode incluir: 

  • Qual é o investimento anual médio em P&D da empresa. 
  • Qual parcela tende a ser elegível conforme critérios técnicos. 
  • Qual a economia tributária estimada em um cenário conservador e em um cenário base. 
  • Quanto será necessário investir em estrutura, governança e suporte técnico para rodar a Lei do Bem com segurança. 
  • Qual o ROI esperado sobre o projeto (benefício / custo) e o payback estimado. 
  • Quais são os riscos principais (documentação, elegibilidade, prazos) e como serão mitigados. 

Quando esses pontos são estruturados em números e cenários claros, a Lei do Bem deixa de ser apenas um benefício fiscal pouco tangível e passa a ser tratada como um programa recorrente de aumento de eficiência tributária e de reforço de competitividade via inovação. 

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